não sou uma pessoa otimista nem pessimista por natureza. deixo minha percepção ser guiada por ações e acontecimentos e, dito isso, meu diagnóstico é de que estamos lascados. a eleição municipal por aqui foi um tapa na cara e o resultado nos Estados Unidos, outro. eu ainda estou tentando entender como navegar um mundo onde o apreço pela democracia parece fora de moda e eu, cafona.
do alto dos meus 28 anos, a sensação é de que cheguei na festa da democracia atrasada, já com as luzes do salão se acendendo, escoltada por vassouras que abrem caminho para uma outra turma que está chegando e que não quer minha companhia e nem a lembrança de que vim.
quando o pessimismo me consome, eu lembro de um senhor que eu entrevistei há alguns anos perto de Corumbá, Mato Grosso do Sul. a casa dele quase foi devorada pelo fogo no Pantanal. o barco (!) não escapou. vendo a fumaça de novas queimadas no horizonte, ele disse: a gente tem que continuar tentando, né? se não, vai fazer o que?
continuamos.
eu ouvi
três episódios para começar a entender a eleição do Trump: A Small Thing That Gives Me a Tiny Shread of Hope (a primeira história sobre um casal com visões opostas da política é muito boa) e This Is The Cake We Baked (esse saiu depois dos resultados), do This American Life. e esse episódio do The Run-Up, o podcast sobre eleição do New York Times, em que uma eleitora do Trump explica os motivos que a levaram a votar nele: frustração e interesses pessoais.
um pequeno conselho: se você gosta de jornalismo em áudio, considere assinar o New York Times. o aplicativo de áudio tem muito conteúdo bom, desde podcasts como o This American Life até matérias lidas de revistas como a New Yorker e The Atlantic.
o álbum novo do Bon Iver, meu grande companheiro de cozinha e corrida. minha frase preferida tá na última música: sabe o que é melhor? nada fica igual. recomendo também essa entrevista do Justin Vernon na New Yorker (que também saiu no New Yorker Radio Hour, um podcast muito elegante).
a entrevista do Caetano Galindo no Fio da Meada, o novo podcast da entrevistas da Rádio Novelo conduzido pela Branca Vianna. o Galindo é autor do “Latim em Pó", um livrinho muito bom que conta a história da nossa querida língua. digo livrinho porque é pequeno mesmo e fácil de carregar por aí.
eu li
eu gosto de ler obituários. eu já recomendei uma coletânea deles aqui e concordo que até crianças deveriam ler. dia desses, lendo a versão impressa da Folha, meus olhos pararam na foto de um rapaz que me parecia jovem demais pra ocupar justo essa editoria – porque, sim, eu ainda me apego a ilusão de que a Morte é etarista quando, na verdade, ela talvez seja das últimas coisas verdadeiramente democráticas. o texto contava da vida de Pedro Henrique Miranda, um jornalista pernambucano de 28 anos que se mudou pra São Paulo para trabalhar no Estadão. morreu de parada cardíaca, enquanto se preparava para um plantão. dias depois, um amigo me contou que havia morrido mais uma jovem jornalista do Estadão – Beatriz Capirazi, 26 anos, parada cardíaca. é quase impossível não enxergar uma linha conectando essas duas histórias e tantas outras de colegas de profissão que adoecem por causa do jeito como decidiu-se trabalhar na Redação (no singular, porque todas operam numa lógica vergonhosamente parecida). aos jornalistas que me leem, um convite: tentemos reimaginar o nosso ofício. se não pra nós, pelo menos pros que virão depois.
essa coluna do Modern Love escrita diretamente de um campo de batalha. num front, ela e a vontade de manter a casa arrumada. do outro, um marido que deixou uma camiseta em cima do aparador por semanas. sim, se-ma-nas.
eu vi
Ainda Estou Aqui. como quase tudo nesse país, é muito triste e muito bonito ao mesmo tempo. e também o filme novo do Almodóvar, O Quarto ao Lado. esteticamente impecável com diálogos que eu queria muito saber como foram escritos. se puder, veja no cinema.
muitos vídeos de um canal chamado Never Too Small, que mostra como habitar de casas e apartamentos pequenos com conforto. essa aqui me deu vontade de achar um terreno, um arquiteto e dinheiro, claro, pra dizer: quero uma igual!
agora combinando a editoria de cinema com a de arquitetura: revi Medianeras (tá na Mubi), um filme argentino muito simpático sobre onde a gente vive, como a gente vive e como isso afeta nosso jeito de amar.
obrigada por ler! 💌
Natália Silva | jornalista e editora executiva da Rádio Novelo
Já comentei uma vez que o determinismo pessimista que assola a gnt nesse momento político é, possivelmente, estratégia ideológica capitalista. Fica esse sentimento de impotência e de que não somos bem vindos e que não temos outra opção - mais fácil o mundo acabar (em guerras, em mudanças climáticas, em pandemias…) do que o capitalismo acabar. E agora, tentando lutar pra não me manter nesse conformismo, tenho pensado que a democracia que entendemos talvez não volte a existir. Não me alinho com as ideias da extrema direita mas não sei se a democracia que idealizamos é a resposta. Precisamos de outra coisa. Viajei pra China esse ano, pensando que talvez seja um terceiro modelo pra pensarmos e talvez seja, apesar de não ter representatividade de mulheres e étnicas. Tenho pensando que a angústia venha de estarmos procurando a resposta desse momento em lugares errados… mas não sei qual o lugar certo tb! Obrigado pelas indicações e reflexões :)